São Paulo — O presidente da Câmara, Milton Leite (União), propôs um projeto de lei que amplia até 2054 o prazo para a eletrificação da frota de ônibus municipais de São Paulo. O PL 825/2024, que trata sobre o tema, pegou de surpresa pessoas que acompanham as discussões no setor, provocou críticas por dilatar em 16 anos um limite que já tinha sido estendido em 2018 para 2038 e é visto como “uma bomba” na mobilidade urbana e na política ambiental da cidade.
O PL de Leite foi proposto na última terça-feira (3/12) e aprovado em primeira votação já no dia seguinte. Não há data definida para a segunda votação. A primeira crítica de representantes da sociedade civil é a de que não houve qualquer discussão com os cidadãos a respeito de um assunto que, na prática, passa uma borracha em cima do que foi estabelecido pela Lei do Clima, de 2018, no que diz respeito aos ônibus. Até o momento, só 3,7% dos coletivos são elétricos na capital paulista.
Questionado nesta segunda, o vereador afirmou em nota que o PL “tem o objetivo apenas de adaptar a política de substituição da frota de ônibus às dificuldades impostas pela Enel, que não implantou a infraestrutura necessária para fornecimento de energia para os novos ônibus elétricos, incluindo subestações e redes de distribuição”.
Por meio do PL, o presidente da Câmara também tornaria bastante suave a substituição parcial dos coletivos ao longo do tempo. Antes prevista já para 2028, no fim do segundo mandato de Ricardo Nunes (MDB), a troca de metade da frota por ônibus movidos a energia limpa ficaria para 2044 (20 anos após a entrada da lei em vigor).
A proposta de Leite também acabaria com a proibição de que novos ônibus diesel sejam inseridos no sistema de transporte, determinação que vigora desde 2022.
A proximidade de Leite com o setor de transportes públicos é antiga. O presidente da Câmara chegou a ser investigado na Operação Fim da Linha, por causa de sua proximidade com Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, presidente da Transwolff, empresa suspeita de ligação com o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Além de ampliar o prazo para tornar a totalidade da frota movida por energia limpa, o PL do presidente da Câmara prevê também que empresários possam compensar as emissões comprando crédito de carbono. Para o especialista em mobilidade urbana Rafael Calábria, essa proposta, na prática, acaba com a Lei do Clima.
“A possibilidade de trocar por crédito de carbono faz com que o empresário compre um crédito de carbono que pode vir de outro país, gerando benefício em outro país. E aqui, na cidade onde 11 milhões de pessoas respiram todos os dias, vai seguir a poluição”, diz Calábria.
“Essa possibilidade de crédito de carbono para um setor que gera poluição onde as pessoas vivem é muito mais grave. É uma manobra para acabar com a efetividade da Lei do Clima”, afirma.
Calábria também diz que a lei proposta em 2018 já levava em consideração as dificuldades que o setor teria para trocar os ônibus, mas que foi amplamente debatida em audiências e reuniões. Segundo o especialista, o principal problema foi a demora da prefeitura em tratar do assunto, deixando para o último ano, quando passou a subvencionar a troca dos coletivos realizada pelas empresas
Uma audiência pública foi realizada na tarde desta segunda para tratar do tema e diversos representantes da sociedade social se manifestaram de forma contrária ao PL de Leite. Entre os pontos destacados há o fato de que a prefeitura não chamou para si a responsabilidade de prover a infraestrutura para o reabastecimento do veículos elétricos e nem exigiu das concessionárias que isso fosse feito.
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) seria questionado sobre o PL dos ônibus ao final de evento realizado no Tribunal de Contas do Município (TCM). A sua assessoria foi informada a respeito disso, mas, depois de dizer que responderia às perguntas dos jornalistas, o prefeito saiu do local sem atender à imprensa, quando todos os repórteres já estavam posicionados.
Descumprimento
Como mostrou reportagem publicada pelo Metrópoles nesta segunda (9/12), a Prefeitura de São Paulo descumprirá a meta de 20% da frota de ônibus com energia limpa até o fim deste ano. Atualmente, somados os trólebus, apenas 3,7% dos coletivos são movidos a energia elétrica.
Até o momento, a prefeitura já gastou cerca de R$ 500 milhões para subvencionar a compra de pouco mais de 200 ônibus por parte das empresas. O dinheiro segue diretamente para as fornecedoras dos veículos.
O que diz a prefeitura
A Prefeitura de São Paulo afirma que “aguarda o trâmite do projeto no âmbito do legislativo e reforça que a cidade tem a maior frota de ônibus elétricos do país, com 491 veículos em operação”.
O que diz Milton Leite
Segundo Leite, atualmente, há a necessidade de renovação de cerca de 3.500 ônibus que compõem o sistema. “No entanto, a concessionária de energia não fez os investimentos necessários para o suprimento de eletricidade, seja nas redes de baixa, média ou alta tensão”, diz.
O vereador afirma que, diante dessa mesma dificuldade, o PL também traz a possibilidade de que as empresas busquem as compensações ambientais necessárias em relação à emissão de poluentes. “O texto do projeto vai respeitar todas as metas de redução de poluentes estabelecidas pelos países na COP”, afirma.
O que diz a Enel
A Enel afirma que, em relação à infraestrutura para o abastecimento de energia das garagens, tem participado de reuniões semanais com os operadores, sempre com o acompanhamento da SPTrans.
“A companhia vem trabalhando junto aos operadores, analisando cada uma das possíveis soluções em função das necessidades específicas, seja para a conexão elétrica individual de cada uma das garagens ou mesmo para possíveis hubs compartilhados de carregamento”, diz.
“As soluções a serem implementadas para cada garagem podem variar, de acordo com aspectos técnicos, econômicos e a definição dos operadores. Há soluções de curto e médio prazo, todas devidamente compatibilizadas com o avanço gradual do aumento da frota elétrica”, afirma.
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